sexta-feira, agosto 11, 2006

Cais, Esperança de Pedra

Aquele cais ali, agudo e nu,
Que o mar percute e coroa de asas,
Sabes? pareces-me tu,
Adiada - e, ao fundo, casas.


Tu, não mulher salva ou perdida,
Nem tu, esperança de pedra,
Mas terra da minha vida
Onde o mar alto medra.


O cais vazio!
O que eu deixei no cais, despachado e chorando:
Meu vulto de menino frio
Que mal aquece um «até quando?»


A linha gris, rasa e arredada
Em minhas lágrimas tão nuas,
E minha ausência procurada
(Um pouco tarde) pelas tuas.


Assim um «teu» num «meu» insiste.
Que mãe anónima adianta
Cabelo longo e riso triste
À filha feita de tanta
Coisa que não existe?

Ao cais que eu penso
Não chega vela, nem jamais
Asa ou ponta de lenço
Ensina porto ou saudade
— Que é pura pedra sem idade,
Dentro de mim, o cais.

VITORINO NEMÉSIO

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