quarta-feira, março 30, 2005

As cadeiras vazias de Van Gogh



Desde 1888 que estas duas cadeiras estão vazias. Vazias, tal como a vida o impôs ao pintor Vicente Van Gogh. A primeira, pintou-a Van Gogh com as mesmas cores claras e vivas com que, poucos meses antes, ainda pintava searas, flores e campos em explosões de cor. Esta cadeira, porém, não transmite nenhuma força vital, mas muito abandono e ausência. Van Gogh pintou-a para si. E quase se retratou. Ao colocar nela, abandonados, o tabaco e o cachimbo que, nas penosas circunstâncias da sua vida na altura, eram o seu amparo contra a solidão e o isolamento.
A outra cadeira pintou-a para Paulo Gauguin, que o acompanhara nos últimos meses, mas que o iria abandonar à sua sorte, por incompatibilidade, por medo e por incompreensão.
No dia em que se recorda o nascimento de Van Gogh, no longínquo ano de 1853, não faça como Gauguin, dê-se ao incomodo de usar estas duas cadeiras como pretexto para a procura de Van Gogh. Da obra e do Homem. Procure-o no Google ou no Yahoo. Procure-o na Taschen ou na revista especializada. Procure-o no Museu ou na reprodução acessível dos seus quadros. Mas procure-o. Será recompensado.

Eu Pecador, me Penitencio




Os jornalistas são os menos responsáveis nas "gafes" do PSD- Açores sobre as alterações ao sistema eleitoral. Os grandes responsáveis são: Victor Cruz que não sabe o que diz e o PSD que não sabe o que faz.


Os jornalistas são os menos responsáveis nas "gafes" do PSD- Açores sobre as alterações ao sistema eleitoral. Os grandes responsáveis são: Victor Cruz que não sabe o que diz e o PSD que não sabe o que faz.



Os jornalistas são os menos responsáveis nas "gafes" do PSD- Açores sobre as alterações ao sistema eleitoral. Os grandes responsáveis são: Victor Cruz que não sabe o que diz e o PSD que não sabe o que faz.

Os jornalistas são os menos responsáveis nas "gafes" do PSD- Açores sobre as alterações ao sistema eleitoral. Os grandes responsáveis são: Victor Cruz que não sabe o que diz e o PSD que não sabe o que faz.


Os jornalistas são os menos responsáveis nas "gafes" do PSD- Açores sobre as alterações ao sistema eleitoral. Os grandes responsáveis são: Victor Cruz que não sabe o que diz e o PSD que não sabe o que faz.



Esta é a penitência que me impus, por não ter imaginado possível que as gafes sobre o sistema eleitoral que, ontem, atribuí aos jornalistas, afinal tivessem origem no próprio PSD.
A penitência total é a repetição da frase por vinte vezes. Aqui fica o lote das primeiras cinco, como prova pública do meu arrependimento.

terça-feira, março 29, 2005

Meu Deus! Nem os Jornalistas...?!

É a conclusão a que tenho de chegar!

Já nem os jornalistas entendem o PSD-Açores, depois de ter ouvido, na RTP-Açores, e lido, em dois diários regionais, as seguintes afirmações sobre as posições do PSD-Açores relativas ao sistema eleitoral:

"A bancada do PSD defendia que cada deputado fosse eleito por cinco mil votos, em vez dos seis mil actuais".

Não acredito que, mesmo com a actual incontrolada tendência do PSD-Açores para coleccionar disparates sobre esta matéria, que alguém da "bancada do PSD" tenha dito algo muito diferente daquilo que consta do seu projecto de sistema eleitoral. Que é o seguinte:

"Em cada círculo eleitoral são eleitos dois deputados e mais um por cada 5000 eleitores ou fracção superior a 2.500".

Esclareça-se apenas que a referência jornalística aos "seis mil actuais" se relaciona com a disposição estatutária que estabelece a eleição de um deputado "por cada 6000 eleitores recenseados ou fracção superior a 1000".

É verdade, que não houve qualquer ganho de clareza com a retirado pelo PSD do termo recenseados. Antes pelo contrário.

Em primeiro lugar, tem de se reconhecer a cruel ironia dos factos, ao constatar-se que, nem os jornalistas açorianos, especializados em questões parlamentares, têm ideias muito claras sobre o sistema eleitoral que o PSD-Açores considera inalterável no seu esquema básico, porque "a sua percepção por todos os eleitores é imediata, possibilitando uma adesão dos eleitores ao sistema em vigor"(preambulo do projecto do PSD).

De duas, uma.

Ou os jornalistas açorianos são muito mais estúpidos que os eleitores açorianos, ou então, os jornalistas açorianos, enquanto açorianos, têm "percepções imediatas" de que são destituídos...enquanto jornalistas.

Em segundo lugar, há aqui um sinal dramático para quem se preocupe com a saúde do regime democrático regional.

O partido histórico da alternativa nos Açores, que continua a ser o PSD- Açores, (pelo menos, enquanto o PP continuar dominado pelas "térmitas" do regime democrático açoriano chamadas Alvarino Pinheiro e Renato Moura), chega a esta incapacidade radical para fazer passar as suas mensagens políticas, depois de:

1- Os açorianos, lhe terem vindo a voltar as costas, de eleição em eleição, de forma cada vez mais convicta;

2- O PSD-Açores começar a dar sinais de estar a entrar num processo de racionalização e interiorização da sua dimensão actual, cada vez mais circunscrita à ilha e até ao concelho.

As questões postas no referendo interno do PSD-Açores sobre o sistema eleitoral e as suas posições "oficiais" sobre o mesmo são elucidativas a este respeito.

Chega a ser confrangedora, a total incapacidade do actual PSD-Açores para perceber a necessidade de o sistema eleitoral, para além de outras razões, também evoluir para a dimensão de que o PSD foi o primeiro protagonista histórico nos Açores- a dimensão regional.

Para o actual PSD-Açores esta dimensão é perversa e é de afastar.

É muito difícil conseguir uma forma mais eficaz e simbólica de renegar todo o seu passado histórico!

3- O PSD-Açores chega a esta incapacidade comunicacional até com os jornalistas, depois de ter insistido, na última legislatura, precisamente em nome desse pretexto da transparência mediática, que os jornalistas estivessem presentes nos trabalhos das comissões, e depois de ter revelado desprezo absoluto pelos resultados conhecidos do referendo interno sobre o sistema eleitoral.

Referendo que oscilou entre a inconstitucionalidade das perguntas (descoberta, a posteriori!!!) e a sua inutilidade.

4- Depois de o líder parlamentar do PSD, segundo os jornalistas, ter falado em abertura "para uma terceira solução de consenso", sobre o sistema eleitoral.

Terá falado mas não terá revelado o seu conteúdo.

Afinal, para que quer o PSD- Açores, os jornalistas nas comissões?

Quando lá os têm, usa-os para criar "suspense" sobre misteriosas soluções que, em vez de pôr em cima da mesa para os jornalistas verem... as mete na manga. Para eles, e todos nós, continuarmos a especular sobre aquilo que O PSD diz que tem e esquecermos a pobreza daquilo que nos consegue mostrar!

Meu Deus! Nem os "amigos" jornalistas! Que bem tentaram fazer a reportagem, "do ponto de vista" do PSD.

domingo, março 27, 2005

Mstislav Rostropovich é Nome Musical




É verdade.

Rostropovich, Mstislav Rostropovich, o maior violoncelista vivo, continua vivo.

Faz hoje 78 anos.

Nasceu em 27 de Março de 1927, em Baku, no Azerbeijão.

Rostropovich, Mstislav Rostropovich, tocou e gravou todo (ou quase) o repertório existente para violoncelo.

Rostropovich, Mstislav Rostropovich teve a compor, expressamente para o seu violoncelo, nomes como Prokofiev, Britten, Shostakovich, Berstein, Khatchaturian, Lutolawski , Schnittke, Berio, Messiaen e outros. Muitos outros.

Rostropovich, Mstislav Rostropovich dirigiu, durante 17 anos, a Orquestra Sinfónica Nacional de Washington e muitas outras como maestro convidado.

Rostropovich, Mstislav Rostropovich recebeu os maiores galardões e condecorações dos dois mundos em que decorreu a sua longa vida de homem e músico.

No Ocidente, onde vive desde 1974, Mstislav Rostropovich além dos prémios musicais mais disputados (Grammy, Grande Prix du Disque) foi agraciado com mais de 100 condecorações, como a "Legion d'Honneur", a "Knight Commander of the Most Excellent Order of the British Empire", o "Prémio Imperial" da Associação Japonesa de Arte, a Medalha Presidencial da Liberdade, dos Estados Unidos.

Na União Soviética, antes de viver na Europa Ocidental, Mstislav Rostropovich recebeu os prémios Lenine e Estaline e a designação de "Artista do Povo" da URSS. Em 1991, foi ainda agraciado com o "Prémio do Estado Russo".

Já no ano passado, Mstislav Rostropovich foi incluído pela revista Time entre os chamados "Heróis da Europa".

Artista e herói do nosso tempo, Rostropovich, Mstislav Rostropovich é, sobretudo, o mestre perfeito do mais harmónico dos instrumenos de corda.

Para um contacto inicial ou para a recordação de um momento inesquecível, ouçam-no
aqui, a tocar Bach e Tchaikovsy.
E não se esqueçam que a primeira destas interpretações está incluída num CD da EMI, gravado em 1995, que contém algumas das mais belas jóias da música para violoncelo e que... vendeu mais de 250.000 CDs.
Se são como eu. Totalmente incapazes de entrarem sózinhos no mundo da música, façam como eu, deixem-se conduzir pelo nome musical de Mstislav Rostropovich.

sexta-feira, março 25, 2005

O centenário de Verne e a Morte de Salgari



Comemorou-se a ontem o centenário da morte de Júlio Verne.
Nestas comemorações de figuras da literatura confluem sempre razões de dimensão pessoal e de dimensão literária. A dimensão pessoal de Julio Verne, no meu caso, coincide com a da maioria das pessoas da minha geração. Tratou-se de um autor de eleição da minha juventude. A sua primazia só era seriamente disputada por um outro autor de livros de aventuras. Emilio Salgari. Hoje, na jovem, ou apenas mais nova, geração portuguesa, poucos recordarão o seu nome. A não ser através de um dos seus personagens - Sandokan, o tigre da Malásia, o tigre de Mompracem, - que teve revivescência efémera no cinema, há alguns anos, e cujas aventuras o autor desenvolvia em qualquer coisa como uns quatorze volumes, se bem recordo. Mas sempre com a mesma sucessão vertiginosa e hipnótica de fabulosas aventuras em reinos de mistério e fantasia.
É curioso constatar o paralelismo e também o contraste de destinos na memória literária e na própria vida, entre estes dois autores. Júlio Verne sempre viveu com o complexo de que não haveria lugar para ele na história da literatura. Emílio Salgari, também sempre foi ignorado pelos críticos literários, apesar de fazer edições de cem mil exemplares na Itália do sec. XIX.
Na minha juventude, os adeptos de Emilio Salgari eram muito mais entusiastas do que os de Julio Verne. Este tinha a má fama de se alongar fastidiosamente, durante o primeiro volume das suas obras com mais do que um, e durante metade dos capítulos das obras num só volume, na descrição arrastada e excessivamente minuciosa dos preparativos para a aventura.
Desta forma, os fans de Julio Verne, na sua maioria só o conheciam naquilo em que ele era mais parecido com Emílio Salgari. Para eles, os profusos conhecimentos de Julio Verne em matérias cientificas nas mais diversas áreas como a astronomia e a geologia, só o tornavam entediante. As vinte mil léguas submarinas bem podiam ser reduzidas a uma mais bem digestiva meia dúzia. Ou as cinco semanas em balão, a uma quinzena.
Em geral, o pai da ciência-ficção, bem se podia ter ficado pela ficção pura e simples. Foguetes espaciais, submarinos, helicópteros e ar condicionado, quase só interessavam como cenário de aventura e instrumento da mesma. Os meandros do seu funcionamento eram temas demasiado áridos. Para mais, muitos deles, já então, ultrapassados no seu conteúdo técnico e cientifico.
Os incondicionais adeptos de Salgari, nem se davam ao incomodo de fazer essas antologias abreviadas das páginas de aventura de Júlio Verne. Os corsários, piratas, janízaros e sultões de Salgari forneciam-lhes essa vital matéria prima por atacado, poupando-lhes o trabalho de condensação à Reader's Digest.
Singularmente contrastante foi também o rumo da vida destes dois homens, que os acasos editoriais juntaram em Portugal na juventude dos anos 50.
Julio Verne enriqueceu com a popularidade e venda da sua obra. Acabou a sua vida, em férias pela Europa no seu próprio iate.
Emilio Salgari, acabou suicidando-se.
Em despedida, escreveu a vária gente. Aos seus editores, lembrou:
"A vocês que enriqueceram com a minha pele, mantendo-me a mim e à minha família em miséria quase permanente, só vos peço, em troca desse lucro, que cuideis do meu funeral. Saúdo-vos, quebrando a minha pena".

terça-feira, março 22, 2005

Um Papel no Chão de uma Vida

"Romance à parte, descemos então a colina alteada pelos sucessivos acrescentos das cidades sobre as cidades.
A ideia é que ainda agora a Pré-História dos homens não acabou, ainda estamos em luta pelo número de páginas sagradas que cada livro contém, pois estejamos onde estivermos o nosso Livro continua sempre a ser aquele que melhor reproduz a fala de Deus.
É por isso que, em Jerusalém, a imagem de uma rapariguinha soldado que por um instante pára, desvia a metralhadora da cara e levanta do chão um papel já pisado, dobra-o e mete-o no bolso, brilha como uma estrela de uma outra natureza, na luz do dia que sobe.
- Porque precisaria a rapariga soldado daquela folha? Iria escrever nela alguma mensagem? Lembrar-lhe-ia algum recado porque havia esperado e não teria vindo?
Vestida de verde caqui e de cabelo amarrado, teria visto naquele pedaço de papel o início de uma sucessão de palavras que lhe faltavam? Lembrar-lhe-ia pela cor, as rosas do jardim de sua casa? Lembrar-lhe-ia o seu urso de pelúcia? O seu primeiro amor, o seu último brinquedo? A sua primeira narrativa, o seu terceiro poema?
- Um mundo de conjecturas se inicia, ali, onde o anódino alcança o sentido do íntimo humano, e nós ficamos desarmados uns diante dos outros, semelhantes e unidos.
É sobre isso, sobre essa solidão habitada pela imagem do insignificante, que é preciso escrever durante toda a vida, conforme se confirma nas ruas de Jerusalém".
(Lídia Jorge, Passagem por Jerusalém, in JL nº 899 de 16 a 29 de Março de 2005)

Tac, Tac, Tac, Jerusalém




"Denise conhece os cantos da cidade (de Jerusalém) e os transeuntes, os vendedores de velas, os mendigos verdadeiros e os falsos. E a melhor loja árabe onde se vendem essências.
É preciso ouvi-la. O seu carácter é forte e as suas mãos vitais. Denise coloca uma mão sobre a outra e provoca com elas um ruído de espada ou de máquina. Olha na direcção do Monte das Oliveiras e fala mais ou menos assim:
- "Tudo isto começou há muito tempo. Primeiro vieram os assírios que incendiaram e destruíram o Templo de Salomão, e tac, tac, tac, abateram-se sobre toda a cidade. Depois veio Alexandre o Grande, e tac, tac, tac... Em seguida reergueu-se a cidade. Depois vieram os romanos, e tac, tac,tac... Depois Herodes o Grande refez outra vez a cidade. Em seguida veio o imperador Tito e tac, tac, tac, sobre a cidade e o templo, e não deixou pedra sobre pedra. Tac, tac, tac. Veio o imperador Adriano e reconstruiu a cidade. Depois veio Constantino e fez dela uma cidade santa, mas logo vieram os muçulmanos, tac, tac, tac, e ocuparam-na. E a seguir vieram os cruzados da Europa para a libertarem. Durante oitenta anos os santos cruzados aspergiram sangue sobre as pedras de Jerusalém, tendo sido tudo bem picado, tac, tac, tac, durante oitenta anos. E finalmente veio Soliman, o otomano, que reconstruiu as muralhas sobre as quais nos encontramos. O tempo passou e tac, tac, tac..."
É assim que Denise explica, irónica e sábia, as suas mãos enérgicas a imitarem o som do martelo-pilão, o grande instrumento musical que acompanha desde sempre a História".
(Lídia Jorge, Passagem por Jerusalém, in JL, nº 899 de 16 a 29 de Março de 2005)

As Minhas Letras do Jornal de Letras



Nunca consegui dar ao JORNAL DE LETRAS, ARTES E IDEIAS o mesmo tratamento que, habitualmente, dou aos jornais que assino por tradição ou compro por gosto, hábito ou necessidade.
Folheá-los, mais que lê-los,
Olhá-los, mais que vê-los,
Ficar mais pelos títulos do que pelos textos,
Ler mais os colaboradores do que os jornalistas e redactores.
Antigamente, procurar mais os suplementos que o próprio jornal;
Actualmente, procurar mais o brinde ou a colecção aliciadora,
do que os próprios suplementos ou o jornal;
Deixar os jornais alastrarem pelos cantos da casa por descuido,
em vez de coleccioná-los por cuidado ou certeza de deleite
ou utilidade futura.
São muitas as razões para este tratamento privilegiado ao JL.
Há uma, porém, que prevalece sobre qualquer outra.
Há 25 anos, de persistência, resistência e continuidade, esforçada singular e meritória, que o JL me vem premiando com exemplos, amostras, pré-publicações, inéditos e revelações, sobre nomes novos e nomes antigos da literatura, das artes e da cultura do mundo da língua portuguesa.
Aos meus olhos é, sobretudo, este contributo quinzenal do JL que o transforma, de folha de papel perecível como qualquer jornal, num arquivo vivo e perene da evolução e vida da nossa cultura.
O poema de Manoel de Oliveira que ontem me serviu de entrada neste blogue é um exemplo.
Nas duas "entradas" seguintes, vou fazer a minha modesta e anónima comemoração dos 25 anos do JL, com mais dois exemplos.
Desta vez, serão dois textos de outro grande nome das letras e da cultura portuguesa, a escritora e romancista Lídia Jorge.
Esses dois textos parecem-me o exemplo perfeito, embora em miniatura, daquilo que um grande romancista, como é Lídia Jorge, consegue fazer, em meia dúzia de linhas. E que o simples ensaísta, pensador ou comentarista muito raramente alcança, com igual espontaneidade e eficácia. Transformar uma ideia simples, um mero estereótipo histórico ou pessoal ou um banal acontecimento do quotidiano numa impressiva narrativa literária.
Recordo que Eduardo Lourenço, em texto que, de momento, não consigo localizar, explicava que era precisamente esta incapacidade que o impedia de passar do ensaísmo para a criação romanesca.
Aí ficam, nas duas entradas seguintes e sem mais comentários, os dois textos de Lídia Jorge, extraídos duma reportagem sobre Jerusalém, também do último JL, comemorativo dos seus 25 anos.
Ad Multos, Jornal de Letras e José Carlos de Vasconcelos!

segunda-feira, março 21, 2005

Manoel de Oliveira, Faina Poética





Fui

Eu fui Bebé,
fui Cobra,
fui Leão,
fui Cão,
fui Rato.

Herdamos a malícia sorrateira
da Cobra
A coragem frontal e a força
do Leão.
A fidelidade e a raiva
canina.
A rapidez dos movimentos
e a astúcia ágil
do Rato.

Fui como tu Peixe do mar
e Ave de rapina.

Fui como tu terra
e como tu
o pó,
que voltaremos a ser.

Fui como tu
o invisível átomo.
Fui como tu
parte de tudo o que existiu,
como de tudo o que existe
e de tudo um pouco se guardará
em mim,
como em ti,
como em todos nós,
enquanto nos anime o Espírito

Esse Espírito que dá forma
às cousas,
que agita os seres vivos e
sustenta em sua força,
o peso descomunal
das cousas inanimadas.
Sou, enfim, tudo aquilo que fui.

E assim fazemos parte
Desse todo que é tudo
Organizado em ordem a um
desconserto
Desconcertado num concerto
Calculado com precisão
matemática

Pelo tal
ignorado Autor
Do qual
Inteiramente dependemos
Para a sorte ou para a dor
E o percebemos
Como Deus Criador.


(Um novo poeta, para o dia mundial da poesia.

Podem procurá-lo, onde eu o encontrei.

No nº 899 do JL de 16 a 29 de Março deste ano.

Lá, também podem ler a seguinte nota:

Poema escrito no Porto, a 12 de Dezembro de 2004, dia do 96º aniversário do cineasta.

Quanto ao cineasta, ele próprio, podem encontrá-lo aqui, por exemplo).




sexta-feira, março 18, 2005

Presidente Açoriano de 1ª e presidente açoriano de 8ª



Quer descobrir, com apenas dois cliks, a diferença entre um Presidente Açoriano de Primeira Categoria e um presidente açoriano de oitava categoria?

Clik aqui e terá direito à "taluda" do Presidente Açoriano de Primeira.

Clik aqui e receberá o "prémio de consolação" de um presidente açoriano de oitava categoria.

Palavras para quê? É o jornalismo açoriano no seu melhor.

Só uma perguntinha "ingenuazinha":

Neste caso, a razão da diferença de tratamento "jornalístico" não está na ilha de origem dos dois titulares. Estará em quê?


quinta-feira, março 17, 2005

Afinal, o Cardeal Policarpo quem julga que é?


Sobre o polémico anúncio do P.e Serra Pereira, o suplemento Pastoral de "A União," do passado dia 12, publicou um texto assinado por ACI, de que retiro o seguinte naco de prosa pastoral:

"Tudo isto conduziu a novo esclarecimento do Pe. Serra Pereira, que ampara e fundamenta a sua posição com a Doutrina da Igreja.
Em relação às declarações do Cardeal Policarpo o sacerdote manifestou a sua gratidão, e mostra reverência para com a sua autoridade, e recordou que "se o Cardeal entende pronunciar-se, em comunhão com o Santo Padre, sobre alguma questão doutrinal ou moral, fazendo uso da autoridade que lhe foi concedida, compete-me escutar e meditar nas suas palavras, procurando delas fazer vida. Mas se emitiu julgamentos prudentes ou opiniões, qualquer católico é livre para concordar ou não".
Penso que só faltou mesmo a ACI perguntar: Afinal, quem julga que é o Cardeal Policarpo e o que valem as suas preocupações "pastorais", se o P.e Serra Pereira "ampara e fundamenta a sua posição com a doutrina da Igreja"?

Sobre as declarações do Cardeal Policarpo e toda esta questão ver, por exemplo, este texto.

quarta-feira, março 16, 2005

Teresa Berganza




Teresa Berganza é um nome que dispensa adjectivos. Ou apresentações.
É uma vida. Faz hoje 70 anos.
É uma carreira artística. Com 50 anos. Iniciou-a aos 20. A sua estreia em público foi em 1955. A sua estreia internacional foi em 1957, no festival de Aix-en-Provence.
É uma voz. Uma das mezzo-sopranos que marcou o século XX, em interpretações de Rossini, Haydn, Mozart, Bizet, Massenet e muitos outros.
É "a voz de Espanha", como a classificava, ainda recentemente, o jornal El Mundo.
É uma diva, no palco. É uma personalidade, na vida.

Para avaliar tudo isto, fixemo-nos nas seguintes afirmações sobre o seu bem mais precioso- a sua voz:

"Recuerdo que en una conversación con Victoria de los Ángeles ella me dijo algo que me halagó en extremo y nunca olvidaré: "Lo bueno de ti y de mí, Teresa, es que siempre podremos cantar, aunque sólo nos quede una octava, porque somos grandes artistas."
"Espero que tuviera razón porque quiero seguir cantando hasta siempre; solamente pido que la octava que me quede resulte bella y agradable. No me importaría sacrificar los agudos si gracias a ello voy a poder continuar actuando sin perder expresividad interpretativa ni intensidad en el fraseo".

"Mi voz no es grande, no es una voz dramática, pero ha pasado por la Ópera de Chicago, una de las más grandes del mundo. Lo que tiene dentro es mi personalidad. Se canta como se es".
Numa das suas entrevistas, afirmou que não queria morrer, sem ouvir mais uma vez, sempre mais uma vez, "O lamento de Ariana" de Joseph Haydn.
Por mim, e nesta hora, vou ouvir Berganza, mais uma vez, na "Aria di Gianina" também de Haydn, que começa "La moglie quando è buona"...
"La moglie quando è buona"... é como Teresa Berganza.
Quem quiser, tem muita forma de confirmá-lo. Uma delas é neste site.

A Sinistralidade Rodoviária Acabou?




OFEREÇO-ME
Para trabalhar em regime de part/time.
Tenho carta de condução toda completa.
Contactar o telemóvel...


Acabou!?

É a minha lógica esperança. Ou esperançada lógica.

Depois de ler este revelador anúncio, num dos nossos antiquíssimos e prestigiadíssimos diários regionais, cheguei à seguinte inevitável (inescapável, diria em português mediático) conclusão.

O nosso problema nacional de sinistralidade nas estradas só existe porque:

1. O que mais há por aí são cartas de condução parcelares;
2. Pior ainda, cartas de condução incompletas;
3. Muito mais grave ainda, cartas de condução parcelares e incompletas.

Só não percebo duas coisas:

1. Porque é que o anúncio, em vez de ser Ofereço-me não é Procura-se.
Para uma raridade destas, só podia ! (Outra vez, o português mediático)
2. Porque que é que o ofertante só quer conduzir em "part-time"?

O dono de tão singular privilégio condutor deveria ser obrigado (por dever cívico, daqueles que "conduzem" as pessoas às urnas, por exemplo) a uma total e completa entrega ao volante, durante as 24 horas de cada dia rodoviário.

Por favor, não contactar o telemóvel. Está total e completamente i...móvel!

domingo, março 13, 2005

Março das Gralhafadas




Voltemos, então, às "gralhafadas" do mês de Março.
Tinha prometido mais duas. Aí estão elas.
Felizmente, ambas são daquelas que saltam aos olhos. Por isto mesmo, dispensam grandes considerações.
A primeira está inteirinha nestas duas imagens.
Só resta contextualizá-las, para as pessoas que desconheçam ou tenham esquecido donde vieram estas imagens.
Vieram de um anúncio de página inteira que o Grupo Parlamentar do PS da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores resolveu fazer numa nova revista açoriana.
Percebe-se a intenção e...as intenções. O que não se percebe muito bem, é por que razão o Grupo Parlamentar do PS aparece na imagem...reduzido a um único, solitário e desgarrado representante. Que até dá a ideia de lá ter ficado porque o fotógrafo, nos retoques finais da imagem...se esqueceu de o eliminar.
Principalmente, quando se pensa que se trata do maior grupo parlamentar de toda a história do parlamentarismo regional.
Porventura, a mensagem que se pretenda transmitir será a de que o que conta não é a quantidade mas a qualidade. Ou que a unidade entre todos é tão grande que onde estiver um estão todos. Tanto mais que este é um lema que serve para instituições socialmente tão prestimosas e beneméritas como os bombeiros. Porque é que não havia de bem quadrar a um grupo parlamentar?
São possíveis todas estas boas e sãs intenções. Mas a verdade é que elas dificilmente ressaltam da fotografia.
Principalmente porque a fotografia, sendo do grupo Parlamentar do PS, se centra nos membros do Governo, numa (des)proporção de oito para um.
É claro que não fica nada mal a um Grupo Parlamentar mostrar a sua consideração, apreço e mesmo apego ao culto da imagem do Governo. Sobretudo, quando tem a competência estatutária de acompanhar, fiscalizar e "apreciar os actos do Governo" através das iniciativas que promova na Assembleia.
Desconfio é que o "apreço", tão expressivamente publicitado na foto, embora com a mesma raiz etimológica, não tenha exactamente o mesmo conteúdo da "apreciação" que atrás citei do art.32º do Estatuto da Região.
Também é verdade que o Grupo Parlamentar do PS necessita do Governo para "continuar a mudar os Açores para melhor". É mesmo o seu (dele, Grupo Parlamentar) principal instrumento para a mudança.
E pode perfeitamente recorrer à fotografia para deixar isto bem claro. E visto e registado.
O Estatuto da Região, vejam só, até prevê que um Grupo Parlamentar possa "provocar" o seu Governo.
Será possível, perguntarão os mais incrédulos? É a verdade mais "verdadeira". Está claríssimo, nas alíneas c) e d) do art.º 44º.
Agora é que devo ter acertado! Afinal, a fotografia é a forma amável e (porque não?) subtil, de o Grupo Parlamentar do PS "provocar" o seu Governo!
"G'andas" provocadores!!!
Vejam só as voltas que isto deu! A terceira "gralhafada" vai ter de esperar melhor oportunidade.




sexta-feira, março 11, 2005

Aquilino Ribeiro e a moda dos cabelos curtos



"Vejam a admirável inconsciência das mulheres! Porque um dia uma cabotina apareceu no palco a bater a perna de cabelos cortados, vá de tosquiar a cabeça como se fazia outrora às atacadas de lepra, se faz hoje no Aljube e nos hospitais.
A seara imensa de lirismo, que brotou da contemplação das tranças de nossa irmã Eva, foi burlescamente ceifada pela tesoura gordurenta do cabeleireiro.
Pobres vates que não sonharam o anacronismo ridículo de suas musas! O que supunham ser o enfeite por excelência, o emblema voluptuoso da feminilidade, veio sua alteza reinante a Loucura, e decretou que era um estigma de escravidão, um acessório inestético e empecilhento.
Ondas de cabelos louros, de cabelos pretos, enlevo dos amantes, diadema glorioso de uma fronte branca, foram no cisco das carroças para o guano. O que dantes era um humilhação tornou-se uma vaidade.
Esses ex-votos, tão ternos, de tranças penduradas à ilharga dos santinhos pelas ermidas dos montes, não mais falarão às nossas madamas a linguagem suavíssima da penitência, mas sim duma desbragada e tirânica moda.
Como eu choro essas cabeleiras que, em catadupa, cobriam Susana à vista dos velhos libidinosos, a vergonha das noivas ao subirem o tálamo na primeira noite, e que as rainhas de Corneille desatavam pelas espáduas em sinal de realeza e heroicidade!
Em troca que nos oferece Eva, tomada de modernismo? Umas guedelhas à chien a borrifar as têmporas e a courama de uma nuca salpicada de totós de cerda, como presunto cozido, ou mato galego rapado pela roçadeira.
Deus lhe perdoe; que na nossa idolatria não encontra perdão!"

(Aquilino Ribeiro, Crónica Quinzenal in "A Ilustração" de 16-VII-1926

quinta-feira, março 10, 2005

Gralhafadas



Gralhas, Gafes e Trapalhadas






Aqueles que tem acompanhado este blogue saberão que ele, sendo novo demais para ter tradições muito enraizados, quase que nasceu com uma: a tradição das gralhas.
As gralhas que o atacam. As gralhas que ele ataca.
Recordo, por exemplo, que, em Dezembro de 2004, me defrontei com um ciclone de gralhas.
Entretanto, os tempos amainaram. Até que, recentemente, elas, as ditas gralhas, regressaram em bando.
Neste mês de Março. Aliciadas por uma vaga sugestão de primavera embiocada.
Ainda por cima, voltaram acompanhadas das suas amigas "gafes" e das suas vizinhas "trapalhadas".
Tão misturadas que me vi forçado a criar um neologismo que resumisse essa mistura explosiva de gralhas, gafes e trapalhadas.
Talvez por não ser muito imaginativo, linguisticamente falando, pareceu-me que o termo GRALHAFADAS não seria totalmente desajustado para o efeito.
Exemplifiquemos, então, com a primeira de três GRALHAFADAS .
Trata-se da mais antiga. E da mais resistente. Talvez, por ser oriunda de uma família de nobre linhagem. Nem mais nem menos que do JO, ou seja, do Jornal Oficial do Governo Regional.
Talvez, também, por ser uma variante alada das temidas térmitas, esta miss "gralhafada" ataca na Terceira. Sim, na ilha Terceira. Ou será, antes na Ilha da Terceira?
Por acaso, espantam-se com esta designação? Também eu. Mas é oficial. Tal como o berço onde nasceu. Leiam e vejam claramente visto:
Nesta Resolução do Governo Regional e neste Sumário da Resolução do passado dia 3 deste mês.
Se lhe quiserem conhecer os antepassados mais próximos encontram-nos nesta Resolução do Conselho do Governo Regional e neste Sumário de 9 de Dezembro de 2004.
Na Resolução encontra-a no 4º parágrafo e repetida no 5º. No Sumário, encerra o único parágrafo com chave de oiro.
Ao chamar a atenção para esta continuada "gralhafada" oficial estamos apenas a corresponder ao desejo, também oficial, de receber conhecimento dela, se detectada qualquer anomalia na informação do JO.
Aqui fica o registo da anomalia.
De facto, mais do que uma gralha ocasional, trata-se de uma verdadeira anomalia. Ou uma gralhafada resistente e persistente.
Durante dois anos, em 2003 e 2004, andou a cirandar entre os sumários das resoluções governamentais e as próprias resoluções e as versões on-line e as versões escritas. Qualquer interessado nesta arqueologia da "gralhafada", pode confirmar este carácter saltitante, se consultar os JO de 8 de Abril de 2004 e de 9 e 16 de Outubro de 2003.
Basta de tanta insistência no mesmo erro cretino!
"Desengralhafem-se" de uma vez por todas!

domingo, março 06, 2005

Aquilino Ribeiro e os Políticos...Pré-Socráticos



"Numa terra de sebastianistas, onde vieram proliferar as raças mais inferiores que habitaram o planeta, a política tinha fatalmente que descrever a mesma curva desvairada.
Há anos que nos governam dos medíocres os mais intrigantes, e dos aventureiros os mais audazes.
"As pastas dos ministros andam pelo chão, é só debruçar-se e apanhá-las", escreveu uma vez o Dr. Brito Camacho.
O Estado português dá a impressão de uma tenda de louça onde entrou uma manada de toiros. O que se ouve é o alarido do escaqueiramento."
(Aquilino Ribeiro, in "A Ilustração"16-VII-1926)
Nota em tempo. Será que a era política dos "medíocres intrigantes" e "dos aventureiros audazes", que Aquilino verberou no seu tempo e que, todos nós, ainda tivemos que aturar no nosso, ficou definitivamente encerrada com o anúncio, ontem, do novo governo de Sócrates?
É essa a esperança e são esses os sinais! Que eles se cumpram!
Para que cesse, para todo o sempre, o alarido do escaqueiramento taurino na tenda de louça da política nacional!

sexta-feira, março 04, 2005

Mas, Porque é que eu não sou do PSD?!

Como estas "Três pessoas não 'distintas'
E nenhuma verdadeira...»






Sei que esta metafísica questão
Me vai atormentar esta sexta feira,
Talvez este fim de semana,
Porventura, o começo da próxima,
Ou mesmo semanas inteiras,
Que eu, até hoje, sonhava fagueiras,
Livres,
De qualquer sombra
De existencial
Ou metafísica angústia!

Sim, porque que é que eu não sou do PSD-Norte,
Para perceber,
Compreender
Ou até prever
As declarações de Luís Filipe Menezes,
Esta manhã.
Saibam todos os que esta lerem,
Que ele, o próprio, o Luís Filipe Menezes,
O mesmo de sempre,
Da sempre mesma outra margem do Douro,
É firme e incondicional apoiante de Rui Rio,
Se este se recandidatar à Câmara do Porto!
Ele, Luís Filipe Menezes que, até ontem,
O que mais odiava,
Precisamente neste Rui Rio,
Era ele ser
Precisamente, actual Presidente,
Precisamente, da actual Câmara,
Precisamente, do actual Porto!

Mas, porque é que eu não sou do PSD-Norte,
Para poder perceber,
Intuir,
Apreender
A lógica viva e profunda deste PSD,
O mais português dos partidos portugueses?

Eu, que até sou português!
E português com partido!

Mas porque é que, ao menos, eu não sou do PSD- Lisboa,
Para poder perceber,
Compreender
E até antecipar,
A outra notícia desta manhã,
Sobre o Luís Filipe Menezes, o do Sul.
Na verdade,
De nome
Pedro Santana Lopes,
(Ou será o Luís que é o Pedro do Norte?
Tanto faz! É de tirar à sorte!)
Este Pedro,
Dizem,
Supõem,
Prevêem,
(com este, todos os verbos são defectivos mas flexíveis)
Está resolvido a voltar à Câmara de Lisboa!!!

Mas,
Não é esta a pior solução possível ?
Para ele, Pedro,
Para ela, Câmara,
Para ele, PSD
Para ela, Lisboa.

Dizem todos,
Perguntam todos,
Comentam todos.
Todos aqueles
Infelizes e desditosos,
Que, como eu,
Não são,
E estão condenados à pena eterna
De nunca poderem vir a ser
Do PSD-Lisboa!
Por distância ideológica
E fatalidade geográfica!

Mas, porque é que,
Mesmo sem saber porquê,
Eu não sou,
Como tábua derradeira
Da minha cívica redenção,
Do PSD da minha terra,
Do PSD da minha ilha,
Do PSD das nossas ilhas,
Do PSD-Açores?
Poderia, talvez, (cepticismo lamentável)
Nunca vir a perceber
Os mistérios insondáveis do PSD-Norte
e do seu Luís,
Ou do PSD-Sul
e do seu Pedro,
Mas, com certeza,
Sem dificuldade,
Nem engulhos,
Me seria dada a graça
De perceber, hoje mesmo,
Dia fatal
De triste e dura sina,
Porque é que
Victor Cruz,
o primeiro, o maior do PSD-Açores,
Veio anunciar que,
Embora o referendo
Aos militantes do seu partido
Tivesse deixado claro
Que eles queriam
Um novo sistema eleitoral
Com menos deputados;
Embora essa vontade clara,
O PSD- Açores,
Democraticamente,
Através dos seus dirigentes
E órgãos democraticamente eleitos
E legitimado por longos meses,
De afanosas lucubrações,
Por jornais, blogues e reuniões,
Lhes anunciava,
Para seu bem e edificação,
Um sistema eleitoral...
Com mais quatro deputados.
Quatro. Não para toda a Região.
Como querem outros de duvidosa intenção!
Só para S.Miguel e para a Terceira.
Só para a ilha-pai. Só para a ilha-mãe
das outras ilhas!
Cumprem, assim, a vontade dos militantes,
para sete, de nove ilhas.
O que é quase tudo cumprir!
Como é que a mais podiam ser obrigados?

Mas porque é que eu não sou,
Sempre tormentosa e fatal questão,
de um qualquer destes prodigiosos
PSDês?
O do Norte,
Com um só Douro,
Mas
Com duas margens,
Uma do Rui,
Outra do Luís,
Que o Luís,
Tanto quer roubar
Como dar
Ao Rui.
O do Sul,
Com um só Santana
Mas imensas rotas
Para a derrota.
Ou o das ilhas,
Com maravilhas
De soluções
Para quaisquer
Futuras eleições!

Porquê?
Mas, porquê?
Mas, então, porquê?
Mas porquê, os outros,
E que não eu?





quinta-feira, março 03, 2005

As Vitórias de Hoje e as de Ontem



Parece haver uma constante histórica que rodeia as vitórias eleitorais do socialismo democrático. O pessimismo generalizado dos meios políticos e diplomáticos sobre a capacidade dos partidos socialistas para corresponderem aos desafios que a sociedade lhes reserva.
A tendência geral é para se começar a dar expressão forte, ainda mal digerida a vitória nas urnas, às mais atormentadas preocupações sobre o verdadeiro significado e conteúdo dessas vitórias, que, pese a eventual clareza dos programas que as alimentaram, são consideradas nebulosas e vagas, tanto mais que os dirigentes do PS que as protagonizaram nunca são os representantes ideais desses partidos. Esses ficaram na sombra ou por opção própria ou por má escolha das bases.
Este é o outro drama típico dos partidos socialistas, quando ganham eleições. Perdem pelo caminho os seus verdadeiros "Moisés". No caso de Mitterrand, por exemplo, chamava-se Pierre Mendés France. E as carpideiras das vitórias socialistas ( aparecem sempre muitas!), não se cansam de lembrá-los! No caso de Sócrates, também há vários, como muito bem sabemos.
No dia a seguir à vitória, em 10 de Maio de 1981, que o levou à Presidência da França, o próprio Mitterrand fez-se eco dessas reacções negativas, entre suspicazes e malévolas. Diz ele, na suas "Memórias Interrompidas"
"Poucas eleições importantes em França terão suscitado tanto desapontamento e frieza nas chancelarias como as de 10 de Maio de 1981(...) Por todo o lado reinava a inquietação, de Moscovo a Washington, de Bona a Pequim.(...) Porque em parte alguma a mudança é desejada. Como em todas as situações, a aliança das ortodoxias reafirma-se quando a ordem estabelecida é posta em causa. As pessoas estavam habituadas a uma França conservadora, tinham aprendido a conhecer os seus actores, fora possível chegar a algumas bases de acordo. Com esta reviravolta, tornava-se necessário rever compromissos. Deixar de fingir, de dar a entender que um desacordo era um acordo e que tudo corria da melhor maneira no melhor dos mundos."
Estas preocupações e incertezas não poupavam nenhum dos senhores do mundo de então. Nem os americanos nem os russos. Como esclarece o próprio Mitterrand: "Os títulos e os subtítulos do Le Monde de 12 de Maio traduziam fielmente o estado de espírito, após a minha eleição "Washington: confusão e interrogações. Moscovo: Embaraço e ambiguidade".
Mas porque razão, a força dessas simples palavras, democracia e socialismo, suscita tanta preocupação e angústia em todos os que se consideram, por um pretenso direito histórico, senhores da "verdadeira" ordem do mundo? Porque é que o voto do povo nessas duas palavras provoca abalos tão profundos no ânimo resoluto desses senhores do mundo tal como ele é e tal como eles acham que deve continuar a ser?

Aquilino Ribeiro e o Jazz


"O jazz-band costumava oferecer-se em espectáculo na feira de Alcântara, numa barraca de ripas de lona, miserável, rudimentar e cachaceiro.
Esses ios que gaiteiros e batucadores intercalam na barulhada, e que a telefonia sem fios nos traz do Hotel Savoy, de Londres, através do céu frio da costa Álbion, como uma guinada de luxúria, confinava-se ao tempo, neste ritornelo pandilha:
O preto mais a preta
Fizeram uma salada!
Ninguém que se prezasse se dava ao desenfado de ir ouvir a musica bárbara dos pretalhões e seus saracoteios obscenos. Não porque fosse zona interdita ao pudor, mas porque era apenas uma diversão sem graça nenhuma.
Em Paris apareceu aí pelo ano de 1910, num terreno vago da Place Clichy levados pelos tuaregues. Os míseros tiveram de variar a exibição, engolindo serpentes e simulando combates à sua maneira, para não morrer à fome.
Hoje, graças ainda à loucura reinante, o jazz-band é a música do dia. Nas salas, nos teatros, nos banquetes, nos bródios solenes e saraus. Proscritos os mesureiros Chopin e os ledos e espirituais Weber. Quanto mais supernegróide, mais requintado.
Um bispo negro pensou em adaptá-lo às funções do culto e, se a religião lhes pega, temos jazz-band in secula seculorum".
(Aquilino Ribeiro, "crónica da quinzena" in "A Ilustração"de 16-VII-1926)

quarta-feira, março 02, 2005

2 de março de 2005: Uma notícia pode mesmo fazer a diferença?


Confesso que não sei.
Confesso que acredito cada vez menos que uma só notícia possa fazer de um dia qualquer, um dia diferente!
Confesso que não sei se o mais importante não será antes, mais frio até sábado ou que o consumo de electricidade dispara!
Ou a saída do 2º volume do Houaiss!
Tão completo que até tem uma página para as crianças e outra para a pobreza em todas as acepções possíveis no mundo da lusofonia!
Alfabeticamente separadas, como convém!
Confesso que não sei!
Confesso que não sei o que fazer à balada da neve do Augusto Gil! Voltar à escola primária e decorá-la mais uma vez? Para castigo de nada ter servido o tê-la decorado, há várias décadas atrás!
Confesso que já não sei o que fazer a cada vez mais conhecimento, cada vez mais inútil!
Mas, alguém saberá!?

terça-feira, março 01, 2005

As Vitórias de Hoje e as Vitórias de Sempre do Socialismo Democrático


A dois dias das eleições do passado dia 20, o mais lúcido e mais respeitável dos pensadores da nossa contemporaneidade, o sempre actual e sempre jovem Eduardo Lourenço, antecipava o sentido da vitória eleitoral do PS, apontando-nos o critério histórico seguro para a sua correcta leitura.
Considero a leitura completa do artigo, que, actualmente, se encontra incluído no Dossier do Público sobre as Legislativas, um acto de cultura elementar, mesmo para quem não se reveja em todos os pormenores do seu conteúdo.
Para a parte que aqui me interessa salientar, transcrevo os seus dois primeiros parágrafos :
"Há trinta anos, o Partido Socialista é, quase por antonomásia, a encarnação da democracia em Portugal. Por culpa própria, em parte, os portugueses já se esqueceram disso. De algum modo, esse é também o maior elogio que se pode fazer ao antigo partido de Mário Soares e de Salgado Zenha: ser "democrático" já não denota nada, como era o caso nos primeiros cinco anos após o 25 de Abril. Nasce-se democrático, como se nasce português e este registo de nascimento parece passado directamente no céu democrático. Não o é. Trata-se de uma conquista histórica de uma dada geração..."
Penso que é esta a regra, para a leitura de todas as vitórias do socialismo democrático nas urnas.
Desde há mais de trinta anos, que, não só em Portugal, mas também um pouco por todo o mundo, que o povo procura, no voto nas correntes políticas do socialismo democrático, a porta de saída para salvar, ao mesmo tempo, a democracia e a busca de novas formas e novos caminhos para o reforço da liberdade, como condição do acesso do maior número ao progresso e à modernidade.
Para o comprovar, poderíamos recuar até ao Chile de Allende.
Não pretendo ir tão longe no espaço nem tão atrás no tempo.
Vou-me ficar pelo 10 de Maio de 1981, em França, com a eleição de François Mitterrand; pelo 28 de Outubro de 1982, com Filipe González, e a vitória do PSOE em Espanha, e pelo nosso 10 de Outubro de 1996, nos Açores.
Mas não vai ser nesta entrada. Fica para próximas oportunidades. Espero que menos marcadas pelos incómodos das irritantes e oportunistas gripes.