quarta-feira, novembro 28, 2007

Por favor, ponha na lapela uma orelha verde



"Antes de decir que es una tontería hay que probar Twitter" · ELPAÍS.com




A propósito da discussão, no encontro bloguista de Sevilha, no último fim-de-semana, sobre os "nano-blogues", o chamado Twiter, ocorreu-me o texto de Teolinda Gersão da sua obra-prima "O SILÊNCIO", recentemente reeditado, em que se procura mostrar que o problema do nosso tempo não é a invenção ou reinvenção de novas formas de comunicar, mas encontrar pessoas que estejam preparadas para escutar.
O texto é dos anos oitenta e tem como símbolo da "caixa de vidro mental" a televisão.
A circunstância de, entretanto, a internet ser outra "caixa de vidro mental mundializada" deu ainda mais actualidade e premência ao tema de um mundo que se, então, tinha começado "a enlouquecer", hoje, pode (deve) estar/está completamente "louco".



teolinda silêncio (capa)1


"É um mundo que começou a enlouquecer, disse de repente.
Um mundo eficiente, de
silêncio total, em que ninguém mais fala com ninguém.
As pessoas estão sentadas, ombro contra ombro, à espera, mas o objectivo da espera é sempre falso, o autocarro, o comboio, o avião, porque todos os lugares são iguais e nada é diferente em parte alguma.
E enquanto se espera o silêncio cresce, vai ficando sempre mais denso e mais pesado, e algumas pessoas começam a ficar inquietas, porque de repente percebem que estão bloqueadas, dentro de caixas de vidro, o universo é um conjunto gigantesco de sucessivas caixas de vidro, e elas apenas transitam, ou são transportadas, de umas para as outras, casas, escritórios, autocarros, hospitais, aeroportos, aviões, transatlânticos, é inútil percorrer milhões de quilómetros porque o mundo fica sempre cada vez mais longe, é como se flutuassem, imponderáveis, num espaço vazio, os
seus pés não assentam mais sobre a terra, correm seis dias sobre escadas rolantes e tapetes rolantes e no sétimo dia ficam parados sobre uma alcatifa, e o mundo que não tocam mais vem até elas apenas em imagens, dentro da televisão-caixa-de-vidro.
Então algumas pessoas são tomadas de pânico e começam a falar, porque acham necessário modificar este estado de coisas, mas descobrem que não é possível falar porque as pessoas do lado as olham com estranheza, a tal ponto se habituaram a viver dentro de caixas bem isoladas que.qualquer som espontâneo as incomoda, transportam em volta da cabeça uma caixa de vidro mental que se fecha por si mesma à menor suspeita de desordem,


e então alguém propõe que quem estiver disposto a escutar os outros ponha na lapela uma pequena orelha verde".

Sem comentários: