A Mariana, no Ardemar do dia 31 de Janeiro, teve a gentileza de incluir o meu nome num grupo daqueles que costumo designar pela blogolândia insular.
A forma que encontrei para lhe agradecer a deferência, como caloiro do bloguismo que ainda mal acabou de ultrapassar o tempo "académico" da praxe, foi, em primeiro lugar, "roubar-lhe" a curiosa imagem do blogger.
Espero que a confissão espontânea me valha o perdão do atrevimento.
Em segundo lugar, deixar aqui duas reflexões sobre o fenómeno do bloguismo que me parecem curiosas. Pela formas diferentes que revestem e perspectivas antagónicas que expressam.
Uma, a forma poética e a perspectiva do blog-sucedâneo perecível do juvenil diário íntimo. Trata-se de um belo poema de Fernando Pinto do Amaral, no seu livro "Pena Suspensa".
O outro, é do conhecido editorialista Ignacio Ramonet, no número de Janeiro de "Le Monde diplomatique" , que situa o fenómeno no enquadramento da crise generalizada dos meios de comunicação social tradicionais. O link permite a leitura completa do artigo, que também pode ser lido na edição portuguesa do jornal. A transcrição que faço é apenas da parte respeitante aos blogues.
Fernando Pinto do Amaral
BLOG
Mantivera no fim da adolescência
o seu diário íntimo:
páginas manuscritas onde ardiam
rastilhos de mil sonhos que rasgavam
as mordaças da angústia social,
a timidez tão própria da idade.
Nessa caligrafia cuja cor
fora ainda a do sangue
colheu a energia necessária
para atravessar como um sonâmbulo
o ordálio daquela juventude,
o seu incandescente calendário
de amizades vorazes, tão velozes
como os amores que julgava eternos
e outras feridas mal cauterizadas.
Hoje quase não volta a essas páginas:
estamos no século XXI
e em vez do diário de outros tempos
mantém agora um blog
onde todos os dias extravasa
recados, atitudes, confissões,
coisas no fundo tão inofensivas
como o fogo que outrora lhe acendia
as frases lancinantes
- embora hoje em dia quando escreve
tenha por um momento a ilusão
de que as suas palavras continuam
a propagar ainda o mesmo vírus,
e a alimentar, quem sabe, os mesmos
sonhos
sempre que alguém desconhecido as ler
como quem só assim então escutasse
um segredo na noite do mundo.
Mas, apesar de todo o entusiasmo
que o mantém acordado por noites sem fim,
ele adivinha que também virá
um dia a abandonar sem saber como
o seu actual vício solitário
e dentro de alguns anos, ao reler
as frases arquivadas no computador,
talvez tudo isso lhe pareça então
fruto de gestos tão adolescentes
como os que antigamente preenchiam
esses cadernos amarelecidos
e hoje sepultados para sempre
em esquecidas gavetas de outro século.
(Fernando Pinto do Amaral, Pena Suspensa,Dom Quixote, Lisboa, 2004, pags. 28/29)
Ignacio Ramonet
"Il y a aussi le phénomène des « blogs », si caractéristiques de la culture du web, qui ont explosé partout au cours du second semestre 2004, et qui, sur le ton du journal intime, mélangent parfois, sans complexe, information et opinion, faits vérifiés et rumeurs, analyses documentées et impressions fantaisistes. Leur succès est tel qu’on en trouve désormais dans la plupart des journaux en ligne. Cet engouement montre que beaucoup de lecteurs préfèrent la subjectivité et la partialité assumées des bloggers à la fausse objectivité et à l’impartialité hypocrite d’une certaine presse. Et la connexion à la galaxie Internet à travers le téléphone-portable-qui-fait-tout risque d’accélérer encore le mouvement. L’information devient encore plus mobile et plus nomade. On peut savoir, à tout moment, ce qui se passe dans le monde."
Fica a pergunta: Bloguismo, moda passageira na vida de cada um e na sociedade de todos, ou fenómeno duradoiro?
Aceitam-se apostas.
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