"Dantes eu pensava que aqui, no centro dos acontecimentos, o sítio para onde tudo converge, tinha-se uma perspectiva melhor, um campo de visão mais largo.
Mas nós estávamos nos bastidores, e não sabíamos o que se passava no palco.
Só o realizador conhecia a peça, cada um decorava apenas o próprio papel, e ninguém sabia exactamente qual era o papel do outro.
Nenhuns boatos chegavam até nós, não havia nenhuma emissora inimiga, nenhuma opinião divergente, nenhuma oposição. Havia apenas uma opinião e uma convicção, por vezes dava a sensação de que todos usavam as mesmas palavras, as mesmas expressões.
Foi preciso primeiro presenciar o trágico desfecho, primeiro voltar à vida normal para poder ver tudo com clareza. Na altura, eu padecia de uma vaga sensação de frustração, de uma angústia que não conseguia identificar, pois o contacto diário com Hitler não dava uma forma concreta a nenhum desses pensamentos".
(...) "Por vezes, eu via os conselheiros, generais e colaboradores de Hitler saírem das reuniões com o Führer com rostos consternados, a morderem os charutos e a resmungar.
Com alguns deles tive oportunidade de falar posteriormente.
E embora fossem mais fortes, sábios e experientes do que eu, não era raro irem ter com o Führer munidos de uma determinação ferrenha, de documentos e argumentos impecáveis, para o convencerem da impossibilidade de cumprir uma ordem, da inviabilidade de uma orientação, e ele pôr-se a falar e antes mesmo que terminasse, todas as reservas tinham-se dissipado, tornando-se sem sentido face à sua teoria.
Eles sabiam que havia um problema qualquer, mas não sabiam precisar qual era.
Saíam desesperados, curto-circuitados, vacilantes na sua dantes tão inabalável opinião, como que hipnotizados.
Penso que muitos tentaram opor-se a essa influência, mas muitos cansaram-se e resignaram-se, e deixaram o barco correr até ao trágico fim.
Mas, conforme dizia, primeiro foi preciso uma derrocada total, um desfecho trágico e muitas desilusões até eu ter clareza e segurança.
Na altura, a vida passava-me ao lado como um riacho tranquilo, eu desfrutava o Verão junto dos lagos no meio de bosques a perder de vista.
Agora, em retrospectiva, quase não me lembro das coisas terríveis que se passaram no mundo em 1943.
A Wehrmacht alemã marchou contra Estalinegrado, e as cidades alemães começaram a sentir a guerra vinda do ar.
Goering fez o seu famoso discurso «Eu não me chamo Goering, se um único avião inimigo aparecer sobre Berlim.»
E as sirenes começaram a gritar, não apenas em Berlim, mas em todos os pontos do Reich".
segunda-feira, maio 09, 2005
O Ângulo Morto Germânico
Publicada por Dsousa à(s) 8:58 da tarde
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário